Lá fizemos todo o primário, a Primeira Comunhão, e nos apaixonamos pelo mesmo e primeiro amor

Otávio Sitônio Pinto

Domingo, o Autor de Por uma Estética do Real (A União) completaria 70 anos de seu nascimento. Estou falando de Luiz Augusto Crispim, o Autor de Introdução ao Estudo do Direito (Saraiva). Conheço-o de outros textos, de quando estávamos aprendendo as primeiras letras no Jardim de Infância do Grupo Escolar Epitácio Pessoa, ali em Tambiá. Era o ano de 1949, não tínhamos quatro anos.

O grupo fica numa esquina mágica, entre a Bica e o Tambiá, e na esquina da Avenida Bandeirantes – o oitão da Bica, guarnecido de eucaliptos, altos, muito altos. Nos fundos do grupo havia um pátio coberto de areia branca, muito branca, para onde íamos no recreio fazer castelos. A musa nos acompanhava: Sônia Lúcia Ramalho de Farias (depois que saiu do Jardim, Sônia foi professora de literatura na pós-graduação da UFPE e UFPB).

Luiz Augusto morava ao lado, ao pegado com o grupo. Nossa mestra Adamantina era sua prima. Quando concluímos o Jardim, fomos para o Colégio Santa Rosália, além Tambiá, pertença de Adamantina. Lá fizemos todo o primário, a Primeira Comunhão, e nos apaixonamos pelo mesmo e primeiro amor, Márcia Maria Dantas. Privamos do encantamento de Márcia até que Adamantina, na véspera do aniversário da morte de João Pessoa, fez uma peroração espinafrando o Doutor João Dantas, justiceiro do presidente. Márcia voltou para o Recife.

Mas uma vez, Luiz Augusto morava perto da escola, na mesma Rua 13 de Maio, rua do colégio e de sua nova casa. Era muito disciplinado. Todos os dias dava brilho no seu Vulcabrás. Eu tinha um igual; a diferença é que o meu não via graxa. Terminado o primário, fomos para o Colégio Pio X. Lá Crispim mostrou-me seu primeiro texto, no silêncio da capela. Sei qual foi o banco.

No último ano do ginásio nos separamos, pois fui expulso do colégio marista e ele ficou por lá. Fui para o Liceu, fazer o clássico, e ele fez o científico no Pio X. Em sua biografia, na Internet, consta que ele fez o secundário no Liceu, mas a informação está errada, Luiz Augusto nunca estudou no Liceu.

Li os originais de um livro de Luiz Augusto, que ele nunca publicou. Foram os originais de um livro de contos, “Afagos de amanhecer e cantar”. Mas logo o escritor amadureceria e arquivou o livro, para se dedicar a textos mais acabados. Juntos fizemos um soneto, publicado por ele, acho que n’ Os Pecados da Tarde, e por mim, nos Caminhos de Toboso, e republicado nas Cantigas de Toboso, que é uma ampliação do primeiro. Os Caminhos foi uma iniciativa de Luiz Augusto, quando subsecretário da Cultura.

Lembro-me quando ele se casou com sua prima Adília, linda. E de quando, uma noite, ele parou o jipe (foi seu primeiro carro) na esquina do Ponto Cem Réis, com o sinal fechado. Chamei-o para tomarmos cerveja no Hawai Bar. Ele recusou, mostrando-me uma lata de leite que viera comprar para a filha primogênita, a morena Tereza.

Senti pena de Luiz Augusto; ele ainda não tinha 20 anos e já era obrigado a comprar leite para a filha, em detrimento da cerveja. Mas o casamento precoce, logo seguido da paternidade, foi sua sorte, pois saiu do bar para o lar. Luiz Augusto foi pra casa estudar; lá produziu uma obra polígrafa, em que escreveu crônicas, romances, ensaios. E foi reconhecido em vida, quando presidiu academias, exerceu o magistério em várias faculdades e ocupou cargos de destaque. Eu fiquei na cátedra do bar.

Quando estou sem destino, fujo para os castelos que fiz com Sônia e Luiz no jardim da infância de Adamantina. Têm um leve cheiro de eucaliptos, um perfume de eternidade. Domingo, fizeram mais um ano.

*Jornalista, escritor, poeta, ensaísta, publicitário e membro do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano, da Academia Paraibana de Letras e da Academia de Letras e Artes do Nordeste.