seg
30
nov
2015

Fernando Pessoa

O mundo lembra, nesta segunda-feira (30/11), os 80 anos da morte do poeta português Fernando Pessoa. Nascido em Lisboa no dia 13 de junho de 1888, ele morreu apenas 47 anos depois, vítima de complicações hepáticas, em um hospital na mesma cidade.

Pessoa passou o início da sua vida – dos 6 aos 17 anos – morando na África do Sul, o que justifica a presença em sua obra de poesias também em inglês, além de traduções de obras de como autores como Shakespeare e Edgar Allan Poe da língua inglesa para a portuguesa. Aos 17 anos, ele retorna para a terra natal.

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Apesar de atualmente ser considerado uma das grandes representações da poesia portuguesa, Pessoa só passou a ter reconhecimento cinco anos após sua morte, com a descoberta de um relicário que reunia fragmentos de contos, traduções, críticas e toda sorte de anotações. Especialistas afimam que durante a ditadura de Salazar, o poeta não chamava atenção porque suas ideias, apesar de modernistas, não tinham conteúdo político.

Heterônimos

Não sei quantas almas tenho
Cada momento mudei
Continuamente me estranho
Nunca me vi nem acabei
De tanto ser, só tenho alma
Quem tem alma não tem calma

A qualidade da poesia de Pessoa se mutiplicava sob os nomes de Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos, poetas que ele criou e que possuem, cada um personalidade e biografia próprias:

Alberto Caeiro

"O guardador de rebanhos" é o nome da série de poemas de Caeiro, que define bem esse poeta criado por Pessoa: Nasceu em Lisboa em 1889, mas passou quase toda a vida no campo. Não teve profissão, nem educação, só instrução primária; morreram-lhe cedo o pai e a mãe, e deixou-se ficar em casa, vivendo de pequenos rendimentos. Vivia com uma tia velha, tia avó. Morreu tuberculoso em 1915. A naturalidade marca seus poemas:

Procuro despir-me do que aprendi
Procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram,
E raspar a tinta com que me pintaram os sentidos,
Desencaixotar as minhas emoções verdadeiras,
Desembrulhar-me e ser eu…

 

Ricardo Reis

Nascido em 1887, Reis escreve poemas que trazem índole pagã, inspirado na cultura greco-latina que defendia o preceito grego do “carpe diem” (viver o “aqui e agora”). Ele foi também foi influenciado pelo estoicismo, escola de filosofia que rejeitava as emoções e os sentimentos exacerbados. Fernando Pessoa não apontou o ano da morte de Ricardo Reis, o que inspirou o escritor português José Saramago a escrever o romance O ano da morte de Ricardo Reis, que foi publicado em 1984, e aponta que ele teria falecido em 1936.

Vive sem horas. Quanto mede pesa,
E quanto pensas mede.
Num fluido incerto nexo, como o rio
Cujas ondas são ele,
Assim teus dias vê, e se te vires
Passar, como a outrem, cala.

Álvaro de Campos

Álvaro de Campos é um engenheiro naval e viajante que se encontra no extremo oposto de Ricardo Reis. Em seus poemas, ele exalta a civilização moderna e os valores do progresso, e tenta integrar e unificar tudo o que tem ou teve existência ou possibilidade de existir. Um dos heterômios mais conhecidos de Pessoa, Campos viveu de 1890 a 1935.

Afinal, a melhor maneira de viajar é sentir.
Sentir tudo de todas as maneiras.
Sentir tudo excessivamente,
Porque todas as coisas são, em verdade, excessivas
E toda a realidade é um excesso, uma violência,
Uma alucinação extraordinariamente nítida
Que vivemos todos em comum com a fúria das almas,
O centro para onde tendem as estranhas forças centrífugas
Que são as psiques humanas no seu acordo de sentidos.

Pessoa fez o seu primeiro poema ainda na infância, para a mãe, e também morreu escrevendo. Sua última frase foi escrita em inglês, no dia 29 de novembro de 1935:

“I know not what tomorrow will bring”

“Eu não sei o que o amanhã trará”

EBC


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Uma resposta para “Ícone da poesia portuguesa, Fernando Pessoa morria há 80 anos”

  1. (DEDICADO A TODOS FILHOS DE… QUE CONHECI NA VIDA)

    POEMA EM LINHA RETA

    Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
    Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

    E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
    Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
    Indesculpavelmente sujo.
    Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
    Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
    Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
    Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
    Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
    Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
    Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
    Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
    Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado
    [sem pagar,
    Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
    Para fora da possibilidade do soco;
    Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
    Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

    Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
    Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
    Nunca foi senão príncipe — todos eles príncipes — na vida…

    Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
    Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
    Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
    Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
    Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
    Ó príncipes, meus irmãos,

    Arre, estou farto de semideuses!
    Onde é que há gente no mundo?

    Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

    Poderão as mulheres não os terem amado,
    Podem ter sido traídos — mas ridículos nunca!
    E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
    Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
    Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
    Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

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